SEPARATA - Mouro 15
DOSSIÊ: 100 Anos de Florestan Fernandes
O ano de 2020, apesar de muito difícil para o Brasil e o mundo devido à pandemia do coronavírus, teve duas importantes efemérides para a esquerda: o bicentenário de Friedrich Engels e o centenário de Florestan Fernandes. Cem anos separam o nascimento do companheiro de lutas e de estudos de Karl Marx e o nosso patrono da sociologia brasileira. Deputado constituinte entre 1987-1988, Florestan levou ao parlamento sua experiência de educador e pesquisador, respeitado até pelos adversários conservadores. A Revista Mouro, cujo mantenedor (Núcleo de Estudos do Capital) nasceu em reuniões no escritório político de Florestan em São Paulo, não poderia deixar de prestar sua homenagem a um dos principais nomes do pensamento social brasileiro e da esquerda marxista.
Este dossiê, lançado agora em forma de separata para registrar a homenagem no ano do centenário de Florestan, fará parte da edição da revista em papel que estará à disposição do público em 2021. Conta com dois artigos de docentes experientes e dois jovens pesquisadores, que visitam a obra do velho mestre para debater as suas diferentes contribuições, da sociologia e antropologia clássicas (de matriz funcionalista), passando por suas reflexões políticas de cunho eminentemente marxista. Certamente existem outros temas caros ao catedrático uspiano, como a questão racial, a cultura popular e o papel emancipador da educação, que são apenas referidos nos textos que compõem o dossiê.
Lincoln Secco, docente da USP que conheceu Florestan quando ainda era um jovem estudante de graduação, escreve sobre os processos que levaram o catedrático da Universidade de São Paulo, elogiado pelo eminente sociólogo estadunidense Talcott Parsons, à militância socialista da maturidade - militância que abandonara na juventude por conselho de seu amigo Antonio Candido, para a dedicação integral aos estudos.
Silvia Adoue, docente da Unesp de Araraquara, escreve sobre o rigor analítico do sociólogo em início de carreira, que conseguiu reconstruir a forma como viviam os Tupinambá, para além dos preconceitos dos europeus que travaram contato com eles no século XVI e deixaram registros escritos. Ela demonstra como os estudos de Florestan ajudam a entender a reconstrução da identidade indígena de seus atuais descendentes, que vivem hoje na Bahia.
Marcelo Ferraro, historiador e doutorando em História Social na USP, faz um balanço do impacto da obra A Revolução Burguesa no Brasil na análise sobre o comportamento das elites brasileiras na segunda metade do século passado, com consequências no país que vê hoje conquistas democráticas sob risco de serem anuladas, com a ascensão de forças reacionárias.
Felipe Duarte, economista e mestre em Ciências Sociais, discute os conceitos de capitalismo dependente e subdesenvolvimento na obra do autor, que orientou o doutorado de dois sociólogos notórios pelas pesquisas na área: Fernando Henrique Cardoso e Octávio Ianni. Em Florestan, analisar o caráter dependente do capitalismo brasileiro leva à compreensão do projeto subalterno dos donos do dinheiro no Brasil ao imperialismo norte-americano, com seus sócios do capital europeu.
Enfim, esta homenagem não pretende ser exaustiva, abrangendo as diversas contribuições de Florestan Fernandes às ciências sociais e à esquerda brasileira. Muitas obras, antes e depois do falecimento do autor, atingiram este objetivo. A Revista Mouro procura apenas cumprir sua obrigação de marcar, com este dossiê, o centenário de alguém que influenciou gerações de estudiosos e militantes socialistas.
Florestan, presente!
|
Perdidos e achados: Os Tupinambá de ontem e de hoje
Silvia Beatriz Adoue
Florestan Fernandes: Ciência e Política
Lincoln Secco
Capitalismo Dependente e subdesenvolvimento na obra de Florestan Fernandes
Felipe Augusto Duarte
As revoluções incompletas e os circuitos fechados do Brasil de Florestan Fernandes
Marcelo Rosanova Ferraro
|